O vício na tecnologia recentemente se tornou pauta para o personagem Theo (Ricardo Silva) da novela "Travessia", exibida pela Rede Globo, em que o adolescente chega a demonstrar sintomas de uma crise de abstinência ao perder contato com a internet, se tornando violento com a família. A OMS reconheceu em seu mais novo CID a existência do “Gaming Disorder” (ou seja, o vício em jogos eletrônicos) como uma doença. Com isso, a psicóloga Elisa Neiva comenta que, “os gamers (jogadores excessivos) têm dificuldade de moderação de acesso ao jogo, colocam o jogo à frente de todos os outros interesses, deixam de comer e dormir; por isso a importantância desse transtorno estar listado no Cid-11”, o que descreve fielmente os sintomas do personagem, que apesar de fictício se inspira em muitos jovens reais.
A falta de controle sobre o tempo de tela pode ser extremamente prejudicial à saúde mental, segundo Elisa: “A Academia Americana de Pediatria recomenda que crianças de 2 a 5 anos não excedam 1 hora de tela por dia; crianças de 6 a 17 anos não excedam 2 horas de tela por dia; e adultos devem limitar seu tempo de tela a não mais de 3 horas por dia”, mesmo assim, dados de um levantamento da empresa de estatística Statista (2016) mostram que a média diária gasta em celulares pelos brasileiros é de 4 horas e 48 minutos.
A psicóloga, especialista em Terapia Cognitiva Comportamental, afirma que o uso excessivo da tecnologia exige urgentemente a imposição de limites e controle, mas reforça: "Tarefa fácil nos tempos atuais? Não! Principalmente neste momento, pós pandemia, onde houve um aumento considerável do uso da tecnologia, que passou a fazer parte de nossas vidas em excesso, tornando seu uso muitas vezes indispensável”. Além disso, Elisa Vieira concorda que a tecnologia pode se demonstrar como uma faca de dois gumes, “por um lado, temos acesso rápido a recursos extremamente úteis, como grupos de suporte online, pesquisas e até mesmo terapia virtual. Por outro lado, o que parece bom pode se transformar em uma fonte de estresse e ansiedade”.
A adição aos smartphones e demais formas de tecnologias tem se tornado um grande problema para a saúde mental de diversas pessoas, “estudos têm mostrado que as pessoas que passam mais tempo nas redes sociais são mais propensas a sofrer de ansiedade, depressão e outros problemas de saúde mental. Isso ocorre porque a mídia social pode criar um senso de comparação e competição, o que pode levar a sentimentos de inadequação e insegurança”, cita Elisa. Para descrever a proporção deste vício tecnológico a psicóloga usa o exemplo do celular como uma ampliação do ser, “os smartphones parecem ser uma extensão do corpo, não há quem não esteja com ele em mãos em qualquer momento do dia. Desta forma, não rompemos vínculos e sustentamos a conectividade, até mesmo afetiva sem interrupção, o que acaba sendo um problema.
Elisa é também pioneira no estudo do transtorno de ansiedade Mutismo Seletivo, e diretora do Instituto Mutismo Seletivo Brasil, com isso ela cita que uma das propriedades do recorrente aumento do uso das tecnologias no dia a dia acabaram sendo de certa forma benéficas a pacientes com esse transtorno, “Nos casos do Mutismo Seletivo - entendido como um transtorno de ansiedade no qual crianças adolescentes e até mesmo adultos não se comunicam em ambientes sociais, com exceção de seus lares onde se sentem confortáveis - o uso da tecnologia tem trazido grandes benefícios, surgindo como uma alternativa de comunicação, sendo transferido para o encontro presencial com grande êxito”.
Porém a especialista termina sua fala com um aviso: “O uso em excesso de qualquer tipo de tecnologia traz uma falsa sensação de realidade, além de aumentar o nível de ansiedade, contribuindo também para o desenvolvimento de outros transtornos, tais como transtornos do sono, aumento do estresse”. E frisa a importância do controle e da desconexão, “é importante estar ciente de como a tecnologia está afetando sua saúde mental. Fazer pausas na tecnologia, estabelecer limites e limitar sua exposição à luz azul pode ajudar a reduzir a ansiedade. Além disso, buscar ajuda profissional, se necessário, pode ser benéfico”.