Chegar aos 26 anos já seria motivo de comemoração, mas muito mais quando se conhece a história da UENF e o quanto esta universidade deu trabalho para “nascer”. Embora o sonho com uma universidade remonte a muitas décadas, o pontapé inicial para o surgimento da UENF foi uma grande campanha popular realizada em Campos em 1989. Aproveitando os ventos democratizantes da nova Constituição Federal, promulgada em 1988, cidadãos campistas se mobilizaram para apresentar uma emenda popular prevendo a criação da Universidade na Constituinte Estadual. Um total de 4.141 assinaturas qualificadas (com dados de identificação completos) embasou a emenda pró-Uenf, afinal aprovada e inserida no Artigo 49 das Disposições Transitórias da Constituição Estadual.
Antes disto, outro episódio importante deixaria marcas na história: viúva e sem filhos, a senhora Maria Tinoco Queiroz, conhecida como Dona Finazinha, deixou em testamento o seu casarão, erguido em zona nobre da cidade, para sediar a Reitoria de uma futura universidade. Falecida em 1970, Finazinha legou à cidade o que viria a ser a Casa de Cultura Villa Maria. Antes do nascimento da UENF, a Casa chegou a ser restaurada pelo governo do antigo estado do Rio em 1974, mas o projeto da sonhada universidade não foi adiante. Ainda na década de 1970, o prédio abrigou a Prefeitura de Campos, até que fosse definitivamente transferido para a Uenf em 1995.
De acordo com Mário Lopes Machado, na ocasião dirigente do Sindicato dos Professores de Campos e Macaé e um dos líderes do movimento pela implantação da Universidade, seria necessário reunir ao menos três mil assinaturas qualificadas. Com ampla mobilização e apoio da Prefeitura, tendo à frente o prefeito Anthony Garotinho em seu primeiro mandato, conseguiu-se alcançar o número de 4.141 assinaturas.
— Eu era professor da Faculdade de Filosofia e diretor do Sindicato dos Professores de Campos. Então, na condição de diretor do Sindicato, nós elaboramos, com a União dos Diretórios Acadêmicos, com a Prefeitura, com a Associação dos Professores da Faculdade de Filosofia, uma minuta de emenda constitucional, com uma série de justificativas, e terminava pedindo que se incluísse onde coubesse um artigo: “O Estado criará a Universidade Estadual do Norte Fluminense, com sede em Campos, num prazo de três anos da promulgação desta Carta.” E a gente conseguiu, num prazo muito rápido, ultrapassar o número de assinaturas necessárias — conta Mário Lopes.
Através da Comissão Pró-Emenda Popular pela Universidade Estadual do Norte Fluminense, o ofício foi entregue ao presidente da Comissão Constitucional da Alerj, deputado Josias Ávila. Durante a audiência na Comissão de Constituição e Justiça da Constituinte Estadual, Mário Lopes pôs na mesa a proposta de fusão da Fundação Cultural de Campos (responsável pelas faculdades de Filosofia, Odontologia e Direito) e da Fundação Benedito Pereira Nunes (mantenedora da Faculdade de Medicina de Campos). Até então, esta era a concepção que norteava o projeto da UENF. Na mesma época, conta Mário Lopes, a deputada Ivete Vargas propôs o monopólio do ensino superior estadual para a Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, à época a única universidade estadual). A iniciativa, também ancorada em proposta popular, contava com mais de 50 mil assinaturas. Porém, segundo Mário Lopes, acabou sendo aprovada a previsão de criação da UENF, com a ressalva de que, se o artigo não fosse regulamentado no prazo de 18 meses, os novos cursos previstos seriam implantados pela Uerj. De acordo com o artigo 49 das Disposições Transitórias da Constituição Fluminense, a UENF teria sede em Campos e outros polos como em Santo Antônio de Pádua por exemplo.
Lutas e prazos
Uma vez promulgada a Constituição Estadual, o desafio era tirar do papel o Artigo 49 antes que perdesse a vigência pela passagem dos 18 meses. Durante um debate entre candidatos à eleição de deputados de 1990, Mário Lopes fez um apelo a que o candidato mais próximo do então governador Moreira Franco o convencesse a editar uma lei regulamentando o artigo constitucional antes de vencer o prazo. Quem se incumbiu da tarefa foi José Carlos Vieira Barbosa, o Zezé Barbosa, que fora prefeito de Campos por três mandatos e na ocasião disputava uma vaga na Assembleia Legislativa. E a estratégia deu certo: no dia 08/11/90 o governador Moreira Franco sancionava a Lei 1.740, que autorizava o Poder Executivo a criar a Universidade Estadual do Norte Fluminense. Segundo Mário Lopes, houve uma solenidade no auditório do colégio Nossa Senhora Auxiliadora, onde foi sancionada a lei de apenas um artigo em que dizia: “Fica criada a Universidade Estadual do Norte Fluminense nos termos do Artigo 49 das Disposições Transitórias”. A festa contou com a presença de políticos dos mais variados perfis, incluindo o então governador Moreira Franco, o então prefeito Anthony Garotinho e os ex-prefeitos Rockfeller de Lima e José Carlos Vieira Barbosa.
Com a lei aprovada, era necessário estudar a implantação da UENF. Uma Comissão nomeada pelo governo elaborou a proposta do Estatuto e a entregou ao governo em dezembro de 1990. Em fevereiro de 1991, o Decreto 16.357 criava do ponto de vista formal a UENF e aprovava seu estatuto. Mas era preciso tirar a Universidade do papel, e esta foi uma promessa de campanha do então candidato a governador Leonel Brizola, que assumiria em 1991.
Ao dar cumprimento a sua promessa, Brizola delegou a Darcy Ribeiro a tarefa de coordenar os trabalhos. Ao assumir a função, Darcy rejeitou a ideia de união entre as faculdades pré-existentes na cidade e propôs o desafio de fazer uma universidade focada em pesquisas, à qual deu o apelido de “Universidade do Terceiro Milênio”. Membros dos grupos mais diretamente envolvidos na luta pró-Uenf, sobretudo professores das antigas instituições de ensino superior de Campos, se sentiram alijados do processo diante do modelo concebido por Darcy, que previa, por exemplo, a exigência do doutorado para todo o quadro docente. Mas os horizontes que se abriram para a cidade puseram Campos e o Norte Fluminense no mapa da ciência e das melhores universidades brasileiras.