Em escalada desde 2015, a importação de produtos à base de cannabis medicinal explodiu durante a pandemia de covid-19 no Brasil, principalmente devido ao aumento de casos de ansiedade, depressão e dor crônica. Segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o número de autorizações de importação desses produtos passou de 8.522 em 2019 para 40.191 em 2021. O uso medicinal dos ativos derivados da cannabis não é novidade. Dados divulgados pelo canal Cannabis & Saúde revelam que o primeiro uso terapêutico da planta aconteceu por volta de 2700 a.C. No livro chinês Pen Tsao, a erva é recomendada contra dores articulares, gota e malária. Desde então, são diversos os registros históricos nos quais a cannabis, assim como uma série de outros ativos botânicos, aparece como fármaco. Com a proibição da maconha, paralelamente à popularização de medicamentos mais modernos, seu uso medicinal diminuiu consideravelmente, ao mesmo tempo que o consumo recreativo por grupos marginalizados se difundia. Em 1830, a maconha se tornou ilegal no Brasil. Nos Estados Unidos, o mesmo aconteceu em 1910, e todos os benefícios relacionados ao uso medicinal da cannabis ficaram escondidos atrás da criminalização imputada à planta, que deixou de ser considerada um medicamento. Hoje, com o avanço das tecnologias e a sociedade da informação, o cenário vem se transformando. A partir desse grande fluxo de dados disponíveis, é possível observar menor resistência da classe médica em prescrever medicamentos à base dos ativos da planta. A Cannabis sativa integra diversas substâncias na sua composição, entre elas o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), que envolvem efeitos como sensação de euforia, relaxamento e bem-estar. As substâncias da maconha se ligam às estruturas das células do sistema nervoso, chamadas receptores canabinoides, provocando efeitos analgésicos, anti-inflamatórios, neuroprotetores e psicotrópicos. Estudos mostram que esses princípios promovem diversos benefícios terapêuticos para o tratamento de situações como esclerose múltipla, epilepsia, câncer, Alzheimer, Parkinson e dor crônica causada pela artrite ou fibromialgia, por exemplo. Alguns quadros de ansiedade, depressão, estresse e insônia também vêm sendo tratados pela erva com sucesso. Outro caso chancelado pela comunidade científica é o uso das propriedades da maconha no mundo esportivo. Os canabinoides, principalmente o CBD, associado a um pouco de THC, podem ter efeito sobre a inflamação e as dores. Por esse motivo, esses compostos derivados têm sido utilizados por atletas para aliviar as dores musculares relacionadas aos treinos intensivos e às lesões. Nos Estados Unidos, por exemplo, existe um problema muito sério de dependência causado por compostos opioides (similares à morfina), utilizados no tratamento da dor. Por serem fortes, muitos atletas tornam-se dependentes após o uso. Nesse sentido, há grande esperança dos pesquisadores em ajudar esses profissionais nos processos de recuperação de forma mais saudável e natural. Hoje, apesar de não existir uma regulamentação ampla para o uso da planta no tratamento de diversas doenças, o Brasil é um dos países que mais produz artigos científicos e materiais de estudo sobre as propriedades da cannabis. Além disso, a evolução científica permitiu unir tratamentos alopáticos e fitoterápicos de acordo com a necessidade do paciente. Esses fatores somados a localização geográfica, extensão territorial brasileira e densidade populacional, torna o Brasil um campo propício para desenvolvimento de novas empresas e medicamentos. Como é o caso que venho acompanhando da NetCann, primeira empresa no Uruguai a abranger toda a cadeia de valor da cannabis, que enxerga nosso país estrategicamente com foco na comercialização de seus produtos fármacos, conforme prescrição médica. Há muitas pesquisas sobre o tema, mas ainda há amplo espaço para novas descobertas e aplicações da cannabis. O fato é que a era de desinformação ficou para trás e os cientistas voltaram a ser ouvidos, bem como os pacientes que transformam suas vidas e de suas famílias com a maconha medicinal. É a ciência quebrando tabus a favor do bem-estar da população. *Por Maria Ribeiro da Luz, CEO da Anandamidia, agência de comunicação especializada em cannabis.